Friday, July 17, 2015

Querido Artur,

Perdoe-me falar-lhe assim de tão longe, mas é que eu tenho andado com a mente tão ocupada que já tem um mês da sua chegada e ainda não consegui lhe visitar. No entanto, eu precisava me despedir desse lugar que há tantos anos tem sido como uma casa para os meus sonhos e resolvi dedicar minhas últimas palavras aqui para você. Por quê? Talvez porque meu inconsciente entendeu que essa seria uma forma de diminuir a culpa pela minha distância. Mas prefiro dizer que escolhi você como destinatário porque, daqui em diante, um novo ciclo se inicia pra mim, tal qual aconteceu com você semanas atrás.

A princípio o mundo parece um lugar bonito, não é? O único jeito de você enxerga-lo é através das vozes daquela que te carrega no ventre e daqueles que te paparicam de fora. Eu entendo. Não há como não ser belo um lugar com som tão agradável quanto a voz de uma mãe. A minha e a sua, pelo menos. Mas nós somos curiosos e, cedo ou tarde, nos rendemos ao desejo de ver com os próprios olhos o que só os ouvidos nos permitem enxergar. É quando vem o susto, os berros e as lágrimas. Era tão confortável flutuar naquele espaço minúsculo que, quando nos deparamos com esse enorme espaço entre céu e terra, nos pomos a chorar.

Mas aquele momento, querido Artur, quando deixamos o conforto maternal de lado, nada se compara a tantos outros que iremos enfrentar no decorrer da vida. Muito menos aquele choro. Porque, à princípio, o mundo parece um lugar bonito, mas, uma vez nele, você percebe que não é bem assim. Existem pessoas ruins, momentos ruins e sensações que você daria qualquer coisa para não sentir. Então você chora. Hora porque a voz que te acalmava o coração não está presente, hora porque alguém te decepcionou, hora porque você mesmo não consegue superar suas limitações e assim vai. O mundo pode até ser bonito, mas em nenhum momento ele será contemplado pela perfeição que você almejava encontrar.

Os anos passam, sentimentos vão e vem tal qual as escolhas sempre irão envolver uma renúncia – por vezes extremamente difíceis de deixar para trás, inclusive. Você vai cair da bicicleta, pode ralar o joelho inúmeras vezes, levar uma surra do valentão da escola ou ser obrigado a comer legumes que odeia na hora do almoço. Vão te ensinar que o melhor caminho para o sucesso é estudar bastante e que dinheiro não importa, mas importa sim, porque é impossível viver de água e luz solar. Nós não somos plantas, Arturzinho, isso é fato. E o que nos torna diferentes é justamente isso: nós até podemos não saber quem verdadeiramente somos, mas, depois que crescemos, conseguimos compreender perfeitamente aquilo que não somos: perfeitos.

É aí, pequeno grande Artur, que está a verdadeira beleza do mundo e que não nos é possível enxergar quando o vemos pela primeira vez: não existe nada – nem ninguém – perfeito ou imune a fracassos. E o mais belo é que, diferentemente das plantas, nós podemos arrancar nossas raízes e partir em busca de um novo terreno para germinar. Essa capacidade de mudar, de sair do lugar que incomoda, de arriscar o trajeto por novos caminhos é o que torna a passagem por aqui tão mágica, porque ficar parado é muito mais arriscado. Somos especiais porque, ainda que tão diferentes, somos iguais. Assim como o mundo, sabe? Tão diferente daquilo que você imaginava antes de vê-lo, mas igualmente – ou até mais – belo se você souber olhar além de suas imperfeições.

Sabe o choro? Ele não é de todo ruim, pelo contrário. Chorar faz bem, alivia a alma, clareia a vista e desata os mais firmes nós que vez ou outra insistimos em manter na garganta. Tem choro de alegria, choro de orgulho e choro de saudade. E são tão intensos quanto confortantes, principalmente quando vem como prelúdio de um alívio há tanto esperado. Não há vergonha alguma em chorar, mas lembre-se também que muito vale à pena sorrir. Nem todo gesto vale mais que mil palavras, mas um sorriso sincero – abraço apertado e sincero também – consegue, sim, transformar em bom dia o mau humor da manhã.

Veja bem, Arturzinho: todas essas coisas que lhe digo não saem daqui com a intenção de te ensinar o caminho das pedras para o sucesso, até porque eu não sou bem o tipo de pessoa que pode ser chamada bem-sucedida – ainda. As coisas não acontecem exatamente como queremos que elas aconteçam, sabe? De uns tempos pra cá comecei a aceitar que tudo acontece no seu tempo certo, mesmo que vez ou outra seja dominado pela ansiedade e direcione a vista pro futuro – o que não é lá muito aconselhável já que, se não agirmos no presente, o futuro que desejamos encontrar trará junto um choro tal qual aquele ao nascer, em intensidade absurdamente maior e mais assustadora.

O mundo não é perfeito, mas tem suas belezas. E, assim como nenhuma verdade é absoluta, a segurança pretendida durante nossa estadia por ele também tem suas falhas. Eu falhei muitas vezes, Artur. Muitas. Também acertei pra caramba, mas não foram os acertos os responsáveis por essa minha iniciativa de ir germinar em outras terras. O solo aqui já não me é produtivo. Não por que a terra esteja inóspita, mas é chegada a hora de plantar sementes novas, colher novos frutos, ver o mundo com outros olhos. Eu já berrei e chorei o tanto necessário para me conformar. Mas é chegada a hora de sorrir um pouco mais. E, grave bem isso, muitas vezes nós precisamos deixar ir embora algo que muito amamos para podermos ser felizes de verdade. Além disso, você também vai descobrir com o tempo, o ventre pode ser o exemplo do mundo perfeito e seguro que você tanto almejava encontrar, mas aqui fora existe um lugar tão seguro e reconfortante quanto: o colo de mãe. Não importa quantos metros de altura você tenha, é o único lugar do mundo em que você sempre vai caber.

Fica com Deus.
Espero que nos vejamos em breve.
Vou ser mais, ainda sendo o mesmo, mas com certeza muito melhor.

Um beijo na testa.
Com carinho,

Tio Artur

1 comment:

Bruna Giroldo said...

Texto Lindo!!! Amei <3