Thursday, July 24, 2014

sobre amores platônicos

Tive uma vida regada de amores platônicos. Talvez, inclusive, o termo apropriado nem seja amor, porque já tenho bem definido este sentimento aqui dentro e ele nada tem a ver com Platão. Paixões platônicas, então. E não me refiro apenas àquelas pessoas com quem gastei meses – quiçá anos – de pensamentos exclusivos e total dedicação sentimental. Eu falo também daquelas que tomaram apenas alguns dias da minha atenção e até mesmo daquelas que apareceram ao amanhecer – algumas ao entardecer – e foram embora tão logo a lua tomou o lugar do sol lá no alto.

Acredito que, em todas essas vezes, o coração pulsava rápida e ansiosamente. Acredito, também, que as mãos tremiam e contagiavam o resto do corpo com aquele nervosismo. Acredito, porque não lembro exatamente se era assim que meu corpo agia. Mas eu lembro – e lembro bem – que, todas essas vezes, minha mente me fazia ter certeza que aquilo era real e ridiculamente impossível de estar em patamar mais baixo que a certeza de um amor pra vida inteira. Mesmo que eu não soubesse quase nada, pra onde estava indo, de onde estava vindo, muito menos o que diabos aquele alguém estava fazendo no meu caminho.

Esse passado, hoje, me faz rir. Porque penso no quanto era – ridiculamente – bonitinho ter todas aquelas certezas dentro de mim. Ainda que por tão pouco tempo, era incrível a dificuldade em fitar os olhos, estar perto ou simplesmente dirigir algumas palavras. Era ridículo porque depois que aprendemos algumas coisas fica difícil olhar para trás com os olhos daquela época. Mas era bonitinho. Porque todos aqueles atalhos, desvios, rios rasos e passos em falso eram, inconscientemente, vistos como esperança de dias melhores. E cada uma daquelas pessoas que causaram esse rebuliço sentimental – desde horas até anos – fizeram parte do elenco principal da minha peça sem ensaio.

Mas o que mais me faz rir – e de felicidade – é pensar sobre esse passado e, ao fitar os olhos no elenco principal atual, perceber que algumas daquelas pessoas ainda continuam lá. Porque paixões platônicas, ao meu ver, são assim: podem ir embora tal qual vieram, mas - hoje eu enxergo, e acredito nisso – sempre existirão aquelas predestinadas a nos ensinar que o patamar de amor pra vida toda não precisa ser ocupado por um único alguém. Sempre tem alguém – ou alguéns – cujo prato, independentemente do tamanho, se faz suficiente para toda a fome do mundo. Parte do elenco responsável pela minha força e coragem ao abrir as cortinas da realidade. Paixões platônicas que viraram amizade verdadeira. Paixões platônicas que, assim travestidas, abriram caminho para que eu aprendesse sobre o amor, as diferentes formas de amar e, mais importante, o amor próprio.

Claro que, enquanto paixões, era natural ter o pensamento focado apenas no que interessava aos impulsos provenientes daquele sentimento. Antes de perceber as tantas outras possibilidades daquela relação, a noite alta – ou o dia claro, ou a madrugada – revelava o quanto era impossível não cogitar um passeio pela outra pele. E o quanto, tendo tanta certeza naquele momento, não era preciso saber mais nada além do simples fato de que eu estava destinado a um final feliz para sempre. E, apesar de não poder dizer o mesmo sobre todas as paixões platônicas que tive, eu posso afirmar com toda a certeza do mundo que, independentemente da real travessia em comum até aqui, a minha certeza de um final feliz se concretizou.

Final feliz. Aquilo que eu entendo não como uma história livre de erros, fracassos ou derrotas, mas como uma história que se construiu sabendo da humanidade do outro. Uma história com arrependimentos e decepções que se fizeram necessárias para fortalecer as fraquezas e valorizar as vitórias. Um final feliz de uma história imperfeita, como eu acredito que a vida deve ser. É assim que eu explico a herança daquelas paixões platônicas que ainda se mantém firmes como parte do meu elenco principal. Assim eu explico o amor que fica nessa parada da vida, quando nos damos conta do que há além de nossas próprias certezas. Aquele amor que, inicialmente travestido com a impulsividade da paixão, chegou devagar, como quem não quer nada, sem dar aviso. Um final feliz. A certeza de um final feliz. Essa que ainda hoje é tão latente entre meus anseios. Não é preciso saber mais nada.

'...Quero ser prudente
E sempre ser correto
Quero ser constante
E sempre tentar ser sincero
...
Não é desejo, nem é saudade
Sinceramente, é de verdade...'

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