Você olha pra mim com esse jeito meio indecente. Como se me devorasse apenas com o olhar. Não é bem o que passa pela sua cabeça, eu sei. Mas me entorpece o corpo. Minhas mãos gelam enquanto disfarço meu próprio olhar. Não deixo transparecer meu incômodo enquanto você dança sensualmente e me olha com o canto dos olhos. Entrego-me a mais garrafas de cerveja. É quase impossível resistir ao perfume que você exala enquanto se move. Sentado no chão no canto da pista de dança eu vejo você ali no meio, de olhos fechados, mãos para cima da cabeça, envolvendo-se em si mesmo. De repente você aponta pra mim, como se me convidasse a acompanha-lo. Eu hesito em levantar-me, mas como resistir ao encanto dessa música quando é você quem me chama para dança-la? Mas como posso ser egoísta ao ponto de dividir a atenção com você? Parece que só há nós dois, mas é como se o universo interagisse para que apenas você estivesse ali. Assim como você, a luz dança pelo ambiente. E é como se o movimento de ambos se completasse. Na hora certa ela ilumina seus olhos fechados, em seguida seu cabelo esvoaçando sutilmente, e logo depois passa por todo o seu corpo, conforme você se movimenta. Mas você insiste, vai chegando mais próximo, com os braços estendidos, oferecendo as próprias mãos para eu me apoiar. Me olha nos olhos e me faz baixar a cabeça, envergonhado, desacreditado que aquela cena possa ser real. Mas levanto os olhos novamente e lá está você. Como resistir ao encanto desses olhos? Até é possível resistir à dança, aos movimentos, ao chamado. Mas resistir aos olhos é impossível. Enquanto você me olha é como se realmente não existisse ninguém. Até me sentiria invisível, não fosse pelo fato de você estar olhando pra mim. Levo minhas mãos às suas e resolvo aceitar o convite. Você me puxa para o centro da pista e passa a movimentar-se ao meu redor. Abre e fecha os olhos, mas, quando abertos, não os tira de mim. Passa os dedos pela minha face, acariciando meus lábios enquanto morde os seus. Era sempre nessa hora que meus sonhos terminavam. Era exatamente enquanto me fazia desejar sua boca que você se esvaía. Era sempre no momento que eu esperara tanto acontecer que você soltava minhas mãos e, sem despedida, me deixava ali. Mas dessa vez era diferente. Você ainda não tinha ido. E mordia ainda mais os lábios, me convidado a tocá-los com os meus. Dessa vez você não apenas me conquistava com os lábios, mas com os olhos. Seus olhos convidavam para que eu me aproximasse mais. Então agradeci o convite com os meus e os fechei. Por mais que não pudesse mais vê-lo, era impossível não te sentir. Então unimos os corpos. Uma sinergia inexplicável. Um convite ao paraíso. Um desvair-se, dessa vez, de comum acordo. Para outra pista de dança em que as luzes iluminem somente a nós dois.
No comments:
Post a Comment