A noite havia caído por toda a cidade. Já não existiam resquícios do sol que passara por ali durante o dia. Alguns cachorros uivavam à lua, enamorando-a. Os carros movimentavam-se pela estrada, enlouquecidos, como que estivessem fugindo.
O bar ficava ali, à beira da estrada, solitário. Era um local sem pudores, sem preconceitos, onde ricos, moribundos, prostitutas, universitários, homossexuais e travestis se encontravam sem olhares recriminadores. A música, ambiente, mantinha o ruído de fora abafado. E todos podiam trocar palavras tranquilamente.
Ali estava Clarisse, sentada em um canto parcialmente escuro, escondida, lamentando-se. Era loira, olhos esverdeados, corpo singelo, de seios pequenos e nádegas protuberantes. Seu rosto sereno exibia as marcas do abuso sofrido. As lágrimas haviam borrado a maquiagem, e a face, antes magnífica, era nada mais que uma mancha de variadas cores.
Não sentia vergonha, era triste. Estava humilhada e ao mesmo tempo em que o ódio a consumia, sorria com o canto da boca. Olhava para os outros três cantos do recinto – onde sombras se faziam passar por pessoas escondidas – e sentia repúdio. Estava prestes a cometer outro crime.
Levou a taça à boca. Cerveja. Não tinha dinheiro para martini, vinho ou qualquer outro destilado. Mas a taça lhe dava um ar superior, daquele jeito que gostava de sentir. Agora não sentia arrependimento. As lágrimas secaram. Retirou algumas moedas da bolsa – já surrada após anos de trabalho – e colocou sobre a mesa. Levantou e andou em direção a porta.
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